Os Kariri-Xocó resistem há mais de 500 anos às invasões de seu território, no Baixo São Francisco – Alagoas, tendo preservado suas tradições mesmo com escassez de peixes, assoreamento do sagrado Rio Opará (conhecido como São Francisco pelos não-indígenas) e subtraída sua língua. Resistem e guardam aproximadamente 200 hectares de Caatinga, único bioma exclusivamente brasileiro. O tronco linguístico é o Macro-Jê e são a lida com o barro e o trabalho das Louceiras, na produção de potes e utensílios, que se destacam nos fazeres manuais. A nação Kariri-Xocó se destaca na manutenção de sua cultura tradicional: musicalidade, costumes e organização social foram preservados, assim como sua intensa espiritualidade.
Nesse contexto nasceu, há 20 anos, o Sabuká, um grupo que tem arraigada a força da tradição e a missão de intercambiar através de seu canto forte, cultura e espiritualidade, realizando anualmente uma grande Jornada. Assim como um rio que cresce ao encontrar o mar, a ciência dos povos originários se fortalece no encontro com todos os povos, de todas as cores. Por isso, anualmente, o grupo Sabuká deixa a Aldeia Kariri-Xocó em Porto Real do Colégio e corre mundo, compartilhando as iniciativas e práticas de Regeneração do corpo território indigena Kariri-Xocó, pensamentos, palavras e coração.
Na presença sobrevivente dos Kariri-Xocó, os participantes das iniciativas e práticas são provocados sobre os cosmos do descolonial: como rachar ou fissurar a colonialidade e como agir a partir de suas fissuras, lembrando da necessária simultaneidade do trabalho dentro, fora e sempre contra o sistema que corrompe e separa. A de(s)colonialidade é — e continuará a ser — uma ação de fazer-pensar-sentir-analisar-teorizar e lutar necessária, contínua e urgente.
A colonialidade trata das formas como o poder, o conhecimento, a organização do mundo e a conceitualização das pessoas no mundo são concebidos em um arranjo estrutural que persiste mesmo após o fim dos colonialismos de estado. É sobre as maneiras subalternizantes como são consideradas as línguas e saberes, as noções de eu e comunidade, as corporalidades e territorialidades, as noções de saúde e doença, as oportunidades de trabalho etc., enfim, tudo que diz respeito ao convívio e relação entre sociedades distintas pautado na hegemonia reivindicada de uma (ocidental euro-americana) sobre as outras. É a partir dessa consciência, amadurecida pelas perdas da Covid-19 e pelo marco de 20 anos do Grupo Sabuká que retomamos as propostas para 2022 com a missão de tocar e despertar corações, alimentar mentes e fortalecer corpos territórios, para um florescer de união, pensamentos críticos que componham mudanças regenerativas em nossa sociedade.
Acreditando que o sistema vence, quando nos separa, se aproveitando da falta de conhecimento, da intimidade, do estar junto que nos fortalece. A meta é provocar o pensamento colonial, o pensamento crítico e fortalecer a identidade de nosso povo brasileiro. Através de palavras, cantos e fazeres, o grupo Sabuká Kariri-Xocó entrega à sociedade chaves importantes sobre inspiração, elementos da natureza e raízes de nossa identidade cultural.